O ministro Kassio Nunes Marques se alinhou aos interesses do presidente Jair Bolsonaro nos dois julgamentos mais importantes dos quais participou desde que chegou no STF (Supremo Tribunal Federal),
Em ambas as oportunidades, o ministro ficou isolado e não foi acompanhado por nenhum colega na defesa das teses que beneficiavam os planos do chefe do Executivo.
Em uma delas, Kassio desagradou a militância bolsonarista ao defender que o Estado pode declarar obrigatória a vacina contra a Covid-19, mas agradou o presidente ao sustentar que apenas a União poderia tomar decisão nesse sentido.
Na outra, Kassio se posicionou pelo veto à reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ), adversário do governo, na presidência da Câmara, e para liberar Davi Alcolumbre (DEM-AP) a permanecer à frente do Senado.
No fim, quatro ministros votaram a favor da recondução de ambos e outros seis foram contrários.
Em outro julgamento com interesse direto do governo, Kassio se alinhou ao ministro Marco Aurélio, conhecido por ficar vencido em diversos processos, para se opor a uma ação que contestava ato de Bolsonaro.
Nesse caso, os outros nove ministros foram no caminho oposto e formaram maioria para derrubar decreto do chefe do Executivo que instituía a Política Nacional de Educação Especial.
Os magistrado entenderam que a medida incentiva a criação de escolas e classes especializadas para pessoas com deficiência em vez de priorizar a inclusão dos alunos, como determina a Constituição.
Marco Aurélio e Kassio, porém, afirmaram que o meio processual escolhido para contestar norma do presidente é inadequado e votaram pela manutenção da norma.
Em menos de dois meses no cargo, o magistrado também correspondeu às expectativas em relação ao anunciado perfil mais garantista em matérias criminais, com uma visão de mais respaldo às alegações dos investigados.
Um exemplo foi dado na decisão liminar (provisória) concedida no último sábado (19) para restringir o alcance da Lei da Ficha Limpa. Advogados elogiaram o despacho, mas movimentos de defesa da legislação que limita direitos políticos de condenados criticaram o entendimento fixado pelo ministro.
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, por exemplo, disse ter visto na medida “uma articulação de forças que pretende esvaziar a lei”.
Em outro movimento que vai na contramão do que Bolsonaro defendia durante as eleições de 2018, Kassio tem sido decisivo para derrotar a Lava Jato em julgamentos na Segunda Turma do STF.
O ministro costuma se unir aos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski para derrotar a operação.
No processo mais emblemático relacionado ao tema analisado por Kassio, o ministro foi voto decisivo para rejeitar recurso da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra decisão que excluiu a delação do ex-ministro Antonio Palocci da ação penal que investiga o petista por suposta doação ilegal de terreno para construção do Instituto Lula.
O ministro ajudou a manter o entendimento de que o ex-juiz Sergio Moro agiu politicamente ao incluir a colaboração de Palocci aos autos do processo às vésperas das eleições de 2018.
O magistrado mostrou que seria contrário aos métodos da Lava Jato já na estreia em um julgamento presencial, na sessão da Segunda Turma de 10 de novembro.
Na ocasião, ele foi voto decisivo para retirar a investigação contra o promotor Flávio Bonazza das mãos do juiz Marcelo Bretas, responsável pela operação no Rio de Janeiro.
Kassio foi indicado por Bolsonaro com o aval do ministro Gilmar Mendes, principal crítico da operação no Supremo, e tem ajudado o ministro a enterrar a operação.
No processo de escolha para a vaga de Celso de Mello, o chefe do Executivo preferiu agradar Gilmar, que é relator da ação que discute o foro especial concedido a Flavio Bolsonaro pelo TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), em vez de estreitar a relação com o presidente da corte, Luiz Fux, que sequer foi consultado sobre a indicação.
Além deste caso, Kassio interrompeu análise de processos no plenário virtual que poderiam atingir de alguma forma Bolsonaro. O ministro pediu que os casos sejam analisados pelo plenário físico, atualmente realizado por videoconferência, e, com isso, retardou decisões que poderiam impactar o presidente.
Isso ocorreu, por exemplo, nas duas ações em que se discute se o chefe do Executivo pode bloquear seguidores nas redes sociais.
Os relatores de cada um dos processos, os ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia, defenderam que o presidente desbloqueie os seguidores que entraram com as ações.
Com o pedido de destaque, o caso vai para as mãos do presidente do tribunal, Luiz Fux, decidir uma data para julgamento presencial.
Kassio fez o mesmo com uma ação penal que discute a gravidade do crime da “rachadinha”.
O processo diz respeito ao deputado Silas Câmara (Republicanos-AM), mas é similar à denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e pode servir de parâmetro para o julgamento do filho do presidente.
Em matérias econômicas, Kassio também seguiu a linha liberal defendida pelo Executivo ao votar pela constitucionalidade do trabalho intermitente previsto na reforma Trabalhista.
O relator, ministro Edson Fachin, defendeu a anulação da norma, mas o indicado de Bolsonaro divergiu.