Chapa de Haddad tem vidraça em investigação e gastos de Márcio França

Com uma campanha ao Senado que exalta sua experiência e tendo emplacado a mulher, Lúcia França (PSB), como candidata a vice na chapa de Fernando Haddad (PT), Márcio França (PSB) teve uma gestão questionada do ponto de vista fiscal e é alvo de investigação por suposta ligação com um grupo acusado de desvios na saúde, o que está no radar de adversários.

França lidera a corrida para o Senado em São Paulo após ter desistido de concorrer ao governo do estado para apoiar Haddad.

O petista, por sua vez, está na frente na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes, com 38%, contra 16% de Tarcísio de Freitas (Republicanos) e 11% de Rodrigo Garcia (PSDB), segundo pesquisa Datafolha.

Integrantes da campanha de Haddad minimizam o possível impacto negativo e dizem não haver preocupação -o discurso é o de que investigações contra políticos são corriqueiras e que todos têm direito à presunção de inocência.

Nos bastidores, porém, há quem admita receio de desgaste caso haja novos desdobramentos da investigação, sobretudo considerando que ataques a França acabam atingindo também a vice de Haddad.

A apuração é feita pela Polícia Civil -petistas dizem esperar que a máquina não seja usada a favor dos tucanos neste caso.
Haddad foi questionado sobre o assunto durante a sabatina do jornal O Estado de S. Paulo.

“Me solidarizei com o Márcio naquela operação porque acho que ela não condiz com o Estado democrático de Direito. Quando você faz uma busca e apreensão na casa de alguém, tem que ter um único objetivo, que é conseguir uma prova.

Agora, como é que você justifica, três anos, quatro anos depois da abertura de um inquérito, um pedido de busca e apreensão? Não faz sentido.”
O petista comparou a questão com processos abertos contra ele às vésperas da eleição de 2018.

“Três anos depois, às vésperas da eleição, você fazer uma coisa dessa. Você lembra, em 2018, entraram com três processos contra mim faltando 30 dias para eleição. Alguém perguntou qual foi o destino desses três processos? A lata do lixo.”

Além da investigação, França recebe críticas por sua passagem pelo Palácio dos Bandeirantes, entre abril e dezembro de 2018, quando assumiu a cadeira de Geraldo Alckmin (PSB) e tentou a reeleição.

A gestão é lembrada por descontrole de gastos e irresponsabilidade fiscal, com direcionamento de verba para a Baixada Santista, seu reduto eleitoral -o que foi visto como uso da máquina na época.

No seu governo, houve iniciativas populistas que elevaram os gastos públicos. França liberou a base no Legislativo para votar favoravelmente ao aumento do teto salarial no estado -pauta-bomba que Alckmin vinha evitando.

França perdeu para João Doria (PSDB) numa disputa apertada (51,75% a 48,25%). Ao assumir em janeiro de 2019, o tucano cortou R$ 5,7 bilhões em gastos, sobretudo na área social, argumentando que França deixara um déficit de R$ 10,4 bilhões.

O governo Doria afirmou ter verificado que o Orçamento elaborado por França contava com receitas incertas e superestimadas, o que gerou o rombo.

Por meio de sua assessoria, França afirmou que o déficit é “mais uma mentira de Doria”. “Deixamos em caixa R$ 13 bilhões disponíveis. Se isso não fosse verdade, as contas não teriam sido aprovadas.”

Ainda em janeiro de 2019, Doria cancelou uma série de convênios firmados por França para repasse de verbas a prefeituras.

De acordo com a gestão tucana, os recursos foram prometidos aos prefeitos sem que houvesse previsão no Orçamento, sem indicação sobre a origem da receita e sem critérios técnicos.

Só na pasta de Desenvolvimento Regional foram cancelados 62 convênios para obras firmados entre 18 e 28 de dezembro de 2018, num total de R$ 158 milhões.
Cidades aliadas de França à época -como São Vicente (SP), administrada pelo seu cunhado; Santos, administrada por um apoiador; e Guarujá, administrada pelo PSB- iriam receber R$ 73,6 milhões.

Na pasta de Turismo, foram R$ 152 milhões em convênios cancelados pela mesma razão: não havia verba separada para esse novo gasto no caixa do governo. Como os prefeitos exigiam o repasse prometido, a secretaria firmou novos convênios para honrar os compromissos nos anos seguintes.

O passivo total do governo França na secretaria do Turismo, de acordo com a gestão tucana, foi de R$ 517 milhões -contando também restos a pagar (despesas que viram o ano fiscal) que foram cancelados pelo governo do PSB, o que paralisou cerca de 300 obras.

No Orçamento de 2022 da pasta, ainda restam R$ 58 milhões a serem pagos em relação a essas dívidas com prefeitos ou fornecedores.

Em relação aos convênios cancelados, a assessoria de França, por meio de nota, afirmou que “Doria apenas retalhou a Baixada, já que os recursos estavam aprovados pelo planejamento e tinham lastro financeiro”.

O cancelamento dos restos a pagar, medida inédita no âmbito estadual e adotada por França em junho de 2018, não afetou apenas o Turismo. Em abril daquele ano, o estado tinha R$ 3 bilhões em dívidas com fornecedores de anos anteriores.

Com a decisão, França abriu espaço para empreender novos gastos, mas obrigou que as despesas não pagas fossem realocadas em Orçamentos de anos posteriores.

Nossas contas foram aprovadas com louvor pelo Tribunal de Contas do Estado e na Assembleia Legislativa. Isso demonstra que tudo foi feito rigorosamente dentro da lei”, afirmou França à reportagem sobre os restos a pagar.

Outro dano eleitoral para França é a investigação em andamento que mira o ex-governador. Em janeiro, a polícia cumpriu uma série de mandados judiciais de busca e apreensão em endereços ligados a ele, em uma investigação que apura um suposto esquema criminoso de desvio de recursos da área da saúde.

A polícia suspeita de elo de França com um médico suspeito de chefiar a organização criminosa responsável pelo desvio de mais de R$ 500 milhões dos cofres públicos na área da saúde.

As apurações trazem conversas de suspeitos que, na opinião da polícia, indicam a suposta proximidade entre os dois.

Entre os principais pontos citados pela polícia, está o encontro entre França e o médico Cleudson Garcia Montali, em 2020, em Belém (PA). O anestesista seria preso em setembro do mesmo ano na operação Raio-X e, posteriormente, condenado no mesmo processo.

A polícia investiga a possibilidade de que o encontro tivesse a ver com a campanha de França a prefeito de São Paulo.

O irmão do ex-governador, o médico Cláudio França, também foi alvo da operação, desencadeada em ao menos 30 locais da capital paulista, litoral e interior, em endereços da família França e de ex-funcionários de organizações sociais, empresários e médicos.

França diz que a operação teve caráter político -“no ano da eleição, em um assunto que não me diz respeito”.

Não sou réu e nem indiciado em nenhum processo em 40 anos de vida pública. Nos meios judiciais, a operação ficou conhecida como bumerangue, já que todos os pagamentos suspeitos haviam sido feitos nos governos do Doria e não no meu”, afirmou em nota.

Anteriormente, sobre o inquérito, França definiu o relatório da investigação como um festival de absurdos, suposições e insinuações. Ele também negou proximidade com o homem investigado no caso e disse que apenas participou de um almoço no qual estavam várias pessoas do governo do Pará e ele estava presente.

Procurada pela reportagem, a campanha de Haddad não quis comentar as questões do seu candidato ao Senado.

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